terça-feira, 19 de janeiro de 2010



"Não confiava em ninguém que não tivesse nenhuma esquisitice.
Valia desde pinguins à astrofísica, de preferência algo que fosse inversamente proporcional à utilidade da coisa...
Também tinha suas esquisitices...várias delas!
Sincronizar o adiantamento dos relógios no horário de verão, organizar livros nas estantes, (mesmo que continuassem parecendo desorganizados) e uma certa neurose com aromas em geral, são alguns exemplos.
Poderia perfeitamente ser capaz de enlouquecer qualquer um que não tivesse certo preparo psicológico.
Assim, encontrou alguém que enlouquecesse na mesma proporção.
Encontrou alguém viciado em groselha, café e vídeos estúpidos no youtube.
Alguém que era capaz de passar madrugadas inteiras com obcessão em assuntos que não interessariam a mais ninguém, entrando num curioso transe de duração indefinida.
Resolveram casar.
Eram praticamente perfeitos!
Achavam graça das piadas mais lamentáveis, reclamavam (não necessariamente das mesmas coisas), ouviam música,(muita música, nem sempre juntos, nem sempre a mesma música).
Ele suportava o fato dela ser metódica e ela, convivia bem com Zelda, Diablo e outros tantos.
Não gostavam sempre das mesmas coisas, mas criaram e descobriram infinitas afinidades.
Nem a insistência dele em não arrumar a cama, nem a relutância dela em aprender outro idioma, eram motivo de briga, no máximo resultavam num diálogo mais acalorado.
Ela colecionava os mais diversos absurdos inúteis e ele, inutilidades absurdas.
Ela fez ele acampar no quarto, sob um céu de estrelas coladas no teto.
Ele ensinou a ela como conversar em silêncio.
Ele aprendeu a comer de palitinhos e ela a desencanar da pilha de revistas que brotava toda semana ao lado da cama.
Aprendeu também a jogar buraco.
Ele passou a suportar cinema iraniano e ela se acostumou com o fato de ele não usar travesseiros pra dormir.
Ele aprendeu a conviver com crises alérgicas e eventuais brigas noturnas com o lençol.
Aprenderam a enlouquecer um ao outro de maneira pacífica.
E por mais irracionais que pareçam, estão nessa há mais de trinta anos.
E continuam não confiando em ninguém que não tenha nenhuma esquisitice."

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